PEDAGOGIA WALDORF

Textos organizados de Valdemar W. Setzer
Introducao Prevencao de Drogas Educacao e Adm. Escolar Contra o uso de computadores A Obsolencia no Ensino TV e Violencia
Comentarios sobre o Livro Danca do Universo IA - Inteligencia Artificial A Idade de Escolarizacao Educacao e Discipina Aprender a Ser Recursos Escpeciais

A OBSOLESCÊNCIA DO ENSINO
Valdemar W. Setzer
(Versão 2.1 de 14/4/01)

1. Introdução

Em 12/2/98 um colega enviou um e-mail a todos os docentes de meu departamento na USP, chamando a atenção para o fato de os jovens quererem usar o computador e a Internet em vez de assistir às aulas. Ele atribuiu esse fato à obsolescência do ensino, implicando que em parte ela é devida ao fato de as escolas não terem acompanhado o desenvolvimento tecnológico do século XX. Estou completamente de acordo com seu diagnóstico: a escola está obsoleta. Mas divirjo totalmente na concepção da causa: creio que a obsolescência não é tecnológica, mas humana.

Este artigo foi originalmente o texto de um minicurso ministrado no IX Simpósio Brasileiro de Informática na Educação, Fortaleza, Nov. 1998. Em janeiro de 2001 foi reescrito e ampliado, com a finalidade de fazer parte de meu livro Os Meios Eletrônicos e a Educação: Uma Visão Alternativa a ser lançado pela Editora Escrituras no fim de abril de 2001. Infelizmente, ele foi cortado dessa edição; apresentamos aqui essa última versão. Todos os artigos citados a seguir como constantes de meu "site", menos o sobre a desmistificação do DNA, estão também nesse livro em forma revista e ampliada.

Este artigo está organizado da seguinte maneira. No item 2, mostro que o ser humano teve mudanças drásticas em sua constituição psíquica, que levaram a verdadeiras descontinuidades na história. Tendo em vista essas mudanças históricas, no item 3 exponho os resultados de mudanças recentes no ser humano, ocorridas no século XX, e que denomino de "novas consciências". No item 4 mostro como o ensino de hoje em dia ainda tem em geral características negativas, herdadas de costumes antigos. No item 5 mostro como essas características negativas não combinam mais com as "novas consciências", justificando a afirmação de que o ensino não acompanhou a evolução humana, e portanto está obsoleto. No item 6 apresento algumas características de um ensino ideal, que estaria de acordo com a evolução humana daquele século. Finalmente, no item 7 faço uma síntese geral, bem como uma referência a um método de ensino que, apesar de relativamente antigo, já apontava para todas essas mudanças, podendo portanto ser considerado como um método adequado para nossos dias, e exponho brevemente por que o problema não é tecnológico.

2. Exemplos de mudanças históricas na constituição humana

Se observarmos a história, veremos que o ser humano foi, por um lado, perdendo certas capacidades, e por outro ganhando outras.
Como uma criança pequena hoje, na remota antiguidade nós éramos muito mais "intuitivos", e nossos sentidos eram bastante embotados. Havia uma inteligência aguda, mas não consciente e lógica como a que temos hoje em dia. Vivíamos num estado de sonho, o que é manifestado claramente nos velhos mitos, desde o de Guílgamech [Lima], passando pela Baghavad Gita [Rohden 1963], até a mitologia nórdica (Thor, Wotan, Widar, etc.) e os contos de fadas dos Grimm. Não era possível exprimir em conceitos claros aquilo que se observava, pensava, sentia e se queria. Vou citar aqui alguns indícios históricos do aparecimento de novas capacidades de observar o mundo, pensar e sentir.

A diferença entre Aristóteles e Platão é fantástica. Isso é mostrado claramente no famoso quadro "A Escola de Atenas" de Rafael, um dos mais inspirados pintores que o mundo já teve. Nele, Platão e Aristóteles descem os degraus da Academia de Atenas. O primeiro segura um livro com o nome Timaios (um dos diálogos mais esotéricos, onde ele fala de Solon contando sobre a Atlântida) e com o outro braço aponta para o céu, com um dedo estendido, sua individualidade apontando para a realidade divina. O segundo segura um livro com o título Ethikon e está com o outro braço estendido para a frente, a mão com dedos abertos voltada para baixo, como se compreendesse e dominasse a Terra [Civita 1968b pr. X (detalhe dos dois); Campos 1973 pg. 22; Janson 1969 pg. 371].

De fato, lendo-se esses dois filósofos, nota-se que Platão ainda estava imbuído da antiga intuição, e não fala muito claramente; em muitos diálogos dirige-se às pessoa mais simples, como o caso de querer mostrar como um escravo poderia aprender a demonstrar um teorema de geometria. Ele está mais interessado nas coisas do espírito do que nas terrenas. O contrário se passa com Aristóteles, que desenvolve o que chamarei de "Lógica Terrena". Um exemplo disso é o seguinte: ele afirma que a "alma" é composta de dois componentes, um perecível, contendo nossas emoções e instintos e o outro eterno [Aristóteles 1952, On the soul, Livro III, cap. 5 pg. 662]. Ele conclui pela necessária existência desse segundo componente por meio de um puro raciocínio lógico: como somos capazes de entrar em contato com conceitos que não dependem de nós, não são materiais e são eternos (como os conceitos matemáticos - o de circunferência, por exemplo) devemos ter algo em nós da mesma natureza eterna. Para Platão, a existência de algo eterno no espírito humano era óbvio [Platão 1952, Phaedrus pg. 124], e não precisava ser deduzido - afinal, ele tinha sido um iniciado nos Mistérios e tinha observado essa realidade.

Um outro exemplo histórico que gostaria de citar é o do Cristo Jesus. Em alguns trechos dos evangelhos (como p.ex. na Parábola do Semeador em Marcos 4 e Mateus 13) seus discípulos perguntam-lhe o significado de suas parábolas. Aí ele diz: "A vós é dado saber os mistérios do reino de Deus" (isto é, do mundo não-físico) e explica conceitualmente o que queria transmitir com as imagens dadas ao povo. Rudolf Steiner, em uma palestra de 18/9/1912 deu uma interpretação bastante plausível para essa frase [Steiner 1996 pg. 71]. O povo não estava ainda preparado para absorver e compreender conceitos, explicações abstratas; era necessário usar imagens que, indiretamente (como o Buda tinha feito com seus discípulos), iriam provocar o exemplo e o desenvolvimento moral que ele desejava. Já os discípulos, que estavam fazendo com ele um aprendizado e um desenvolvimento pessoal enorme, não só moral, mas em sua capacidade cognitiva, podiam compreender os conceitos (como o fizera Aristóteles, mas em questões terrenas) - o que hoje praticamente qualquer pessoa com um mínimo de desenvolvimento intelectual é capaz de fazer.

Um outro desenvolvimento humano posterior decisivo foi uma grande perda de impulsos e visões interiores, e a conseqüente busca de investigar o mundo exterior para preencher o vazio interior resultante. Isso levou à descontinuidade histórica do século XV onde aparecem, entre outros, a investigação científica moderna, os descobrimentos, a perspectiva na pintura e o individualismo. De fato, com relação a esse último aspecto, não se pode conceber o individualismo de um Hamlet no teatro de antes dessa época, e os pintores não assinavam suas obras como Dürer fez questão de fazer com seu afamado logotipo [Civita 1968a pr. I]. Aliás, Dürer inventou um aparelho para pesquisar a recém-desenvolvida perspectiva (introduzida por Bruneleschi justamente no primeiro quarto do século XV [Zajonc 1993 pg. 59]), coisa inimaginável antes [Orlandi 1970 pg. 29]; seu coelho visto em ângulo provocou furor na época, pois achava-se que era impossível pintar algo dessa maneira [idem pg. 55].

Esses exemplos mostram como o ser humano foi mudando, adquirindo novas capacidades de observar, sentir, pensar e agir. Obviamente, os historiadores behavioristas dirão que as mudanças foram culturais e que o ser humano tem sido sempre o mesmo. Prefiro a hipótese de que ele realmente mudou em suas características psíquicas. Essa hipótese explicaria por que certas mudanças ocorreram em partes distantes do globo, por exemplo com Buda (563?-483? a.C.) e Lao Tsé (o fundador do Taoismo, 604?-531 a.C.) ao mesmo tempo que a filosofia grega ou os profetas bíblicos. Aliás, a imensa diferença entre o teatro de Ésquilo (525-456 a.C.), ainda impregnado de culto religioso, e Eurípides (480?-406 a.C) e Aristófanes (448?-380? a.C.), que tratam de problemas humanos (mas ainda arquetípicos, não-individuais - daí terem se tornado padrões psicológicos), mostra a evolução que se estava passando naquela época.

3. Mudanças na constituição humana no século XX

Partindo-se da hipótese de mudanças nas capacidades psíquicas dos seres humanos em certos períodos da história, pode-se conjeturar que grandes mudanças no século XX foram também devidas a mudanças na constituição íntima humana. Vejamos 4 dessas mudanças, que denominarei de aquisição de novas consciências.
Essas mudanças de consciência são, em meu entender, evoluções extremamente positivas feitas no século XX, aparentemente tão negativo, ao ponto de eu denominá-lo o "século da barbárie", devido às tragédias humanas em larga escala que nele ocorreram, como o genocídio dos armênios pelos turcos, os horrores do nazismo, o sacrifício de dezenas de milhões trucidados pelo comunismo, e as tragédias ainda presentes dos nacionalismos e dos fundamentalismos. Aquelas evoluções positivas da consciência humana são a consciência dos direitos humanos, a da paz mundial, a da ecologia e a do universalismo.

3.1 A consciência dos direitos humanos

Penso que o movimento moderno dos direitos humanos iniciou-se decisivamente no século passado, com a abolição da escravatura, mas foi no século XX que ele se manifestou em várias áreas sociais. Darwin, em sua passagem pelo Rio de Janeiro a bordo do "Beagle" em 1832, revoltou-se profundamente com a escravatura. Provavelmente ele não teria tido essa reação se tivesse vivido décadas antes. Por exemplo, não me consta que Goethe (1749-1832), um dos maiores humanistas de todos os tempos, tenha se manifestado contra a escravidão. Outro humanista que considerava a escravatura como parte "natural" - e essencial - da sociedade foi Platão (ver sua República, livro V [Platão 1952 pg. 364]).
Mas é nos últimos decênios que a sensibilidade e consciência pessoais para com os direitos humanos desenvolveram-se extraordinariamente, como se pode ver pelas campanhas contra o racismo, contra o sexismo, contra a discriminação de pessoas portadoras de deficiências ou por condição sócio-econômica, e mais recentemente pelo direito dos não-fumantes de não serem incomodados e prejudicados pelos pobres fumantes.

3.2 A consciência da paz mundial


O movimento pela paz mundial também revela, parece-me, um enorme desenvolvimento da sensibilidade social humana. Talvez hoje em dia, pelo menos inconscientemente, cada pessoa importa-se com todas as outras pessoas. Cada um fica horrorizado quando populações são trucidadas por guerras e conflitos - vejam-se os casos da Bósnia, que levou à ação da ONU por motivos puramente humanitários (não acho que ela representasse um problema político ou econômico para os outros países), da Argélia, de Kosovo, etc. Lembremos também o fim da guerra do Vietnã, causada pela indignação dos americanos e a consciência de sua falta de sentido. Aliás, a própria criação da antiga Liga das Nações e da ONU já foi um indício desse desenvolvimento do ser humano no sentido de acabar com guerras e conflitos.
Penso que a raiz desse desenvolvimento humano é a percepção social de que guerras e conflitos armados não correspondem à nossa natureza humana atual - as divergências deveriam ser resolvidas em negociações, na busca de consensos, e não pelas armas.

3.3 A consciência ecológica

O terceiro indício de uma mudança na consciência humana, especialmente no século XX, é o movimento ecológico. Parece-me que a origem dele é o desenvolvimento de uma sensibilidade para com a natureza que não existiu nos povos "civilizados" durante muito tempo.

Enfatizo minha expressão "sensibilidade", em contraposição a outros motivos subjacentes que são, em minha opinião, não tão importantes, como questões econômicas de longo prazo e saúde. Há pouco houve uma notícia de que a Food and Drugs Administration (FDA) americana passou a recomendar oficialmente o consumo de produtos cultivados organicamente, isto é, sem adubos e pesticidas químicos. As pessoas que se interessam por esses produtos, que vêm tendo enorme expansão desde a década de 70, obviamente têm sensibilidade para a qualidade superior de algo produzido mais naturalmente e menos industrialmente.

Lembro-me bem do início do movimento ecológico no fim da década de 1960: deu-se com o livro de Rachel Carson Silent Spring [Carson 1969]. A motivação de Carson foi a sua constatação de que os pássaros estavam progressivamente sumindo de seu jardim com o decorrer dos anos - o que levou finalmente à interdição do DDT (que produzia o afinamento das cascas dos ovos). Vê-se aí que a origem não foi uma constatação prática utilitária, mas um amor à natureza. Esse mesmo novo amor à natureza é, parece-me, a única explicação para o movimento de defesa das baleias: como se justifica cientificamente a necessidade de preservá-las, contra grandes interesses econômicos, se estão no fim da cadeia alimentar? Como se explica o anseio de não deixar desaparecer espécies animais de qualquer tipo, em qualquer lugar? Essa nova consciência e esse novo amor pela natureza vieram acompanhados daquilo que acompanha qualquer amor altruísta: um sentimento de respeito e veneração. Um exemplo disso é o crescente respeito pelas árvores. Elas não produzem durante sua vida mais oxigênio do que consomem ao serem queimadas ou ao se decomporem - a não ser que seu carbono seja fixado para sempre, o que ocorre quando com elas fazemos, por exemplo, móveis ou assoalhos. Assim, excluindo-se as árvores frutíferas, não há uma utilidade que levasse à proteção que se criou para com elas - por exemplo, na cidade de S.Paulo é proibido derrubar qualquer árvore sem justificativa e autorização oficial.

Entre parênteses, por que todos preferem hoje em dia morar em uma rua arborizada? Penso que isso se deve ao fato de que cada árvore é sentida instintivamente como uma riquíssima obra de arte da natureza. Platão, em O Sofista já distinguia as obras de arte em naturais e humanas [Platão 1952 pg. 578]. Nesse sentido, a natureza não é um cientista, mas sim um artista - vejam-se por exemplo as folhas rajadas do Comigo-Ninguém-Pode ou a moldura das folhas do Coleus-de-Java, parecendo pinturas e não obras de engenharia. A investigação dos seres vivos do ponto de vista científico revela somente uma faceta de sua realidade, que deveria ser complementada por uma atitude artística. Conjeturo que, cientificamente - pelo menos com a abordagem materialista atual - jamais chegaremos a compreender a natureza. A esse respeito, vejam-se as dificuldades aparentemente intransponíveis para se explicar cientificamente a morfogênese, a forma dos seres vivos, o crescimento e a regeneração de órgãos e tecidos, como por exemplo descritas por Rupert Sheldrake [Sheldrake 1987, caps. 1 e 3]. Não estou de acordo com certos aspectos de sua teoria do campo morfogenético [idem, cap. 4], mas o mais importante são suas críticas à metodologia científica corrente, bem como o seu reconhecimento e de alguns poucos cientistas de que há necessidade de se desenvolver novos paradigmas na experimentação e nas teorias científicas. Os paradigmas tradicionais são simplesmente insatisfatórios para uma compreensão profunda da natureza. Pior ainda, deturpam a visão que temos dela.

3.4 A consciência universalista


O desenvolvimento da entidade humana adquiriu no século XX mais uma característica: o sentimento de universalidade. Cada vez mais as pessoas sentem-se cidadãs do mundo, e menos de sua terra natal. Nacionalismos parecem ser hoje em dia aberrações e fanatismos. Um dos sintomas exteriores dessa consciência é, por exemplo, a União Européia. Infelizmente, ela começou do ponto de vista econômico, e não do cultural. Mas foi seguida pela eliminação de barreiras nas fronteiras, que impediam a movimentação das pessoas, a aquisição do direito de morar, estudar ou trabalhar em qualquer país da comunidade, etc.
É interessante notar que a atual onda de globalização da produção é conseqüência dessa característica universalista do ser humano. No entanto, para mim ela é uma caricatura da universalização, levando à satisfação de interesses egoístas e não altruístas. Ela beneficia alguns poucos em detrimento de muitos outros, e como todo resultado de ações egoístas, leva a desastres de um ponto de vista global. Como tem acontecido com muitos impulsos positivos na humanidade, uma maneira de impedir sua manifestação e propagação é deturpá-los.

3.5 Síntese


O movimento universalista está intimamente ligado ao dos direitos humanos, principalmente no que diz respeito à discriminação sexual, racial, étnica e religiosa. Parece que as pessoas desenvolveram a percepção intuitiva de que a essência de todos os seres humanos é da mesma natureza - que para mim é não-física -, e que essa essência não tem sexo, raça, religião ou nacionalidade. Acho que foi o desenvolvimento dessa essência, desse Eu superior individual, diferente em cada um mas da mesma natureza não-física, que levou às quatro novas consciências que citei. Assim, contrariamente aos sociólogos behavioristas materialistas, estou supondo por hipótese que esses quatro desenvolvimentos não são puramente culturais, ou seja, devidos à evolução dos costumes e do conhecimento acumulado, e portanto devidos ao meio ambiente. Contrariamente aos sócio-evolucionistas, como Richard Dawkins [Dawkins 1989 pg. 36], também não creio que essas mudanças sejam genéticas.

Minha concepção espiritualista do universo leva-me a considerar que todo ser humano é fruto de hereditariedade, da influência do meio ambiente (nesses dois pára a concepção materialista) mas também do cerne espiritual, do Eu de cada um. Gêmeos univitelinos podem ter aparência física muito semelhante, ter até inclinações e gostos próximos, mas o destino de cada um, a individualidade que se manifesta através da criatividade e do caminho de cada um é totalmente diferente - e não devida nem à sua hereditariedade e nem às influências do meio ambiente. Essa distinção entre eles vem de si próprios, de seu Eu superior individual que, por minha hipótese de trabalho, é não-físico: a origem da real individualidade, da auto-consciência e da liberdade. Um exemplo clássico das diferenças entre esse tipo de gêmeos é o caso das canadenses quíntuplas univitelinas Dionne: só uma teve epilepsia, duas tornaram-se enfermeiras, três casaram-se, duas fizeram uma faculdade e uma seguiu uma vocação religiosa [Leite 2000 pg. 28].

Parece-me que é devido à evolução desse Eu superior e de sua conexão com nossa constituição inferior - um mero suporte para ele, e que o permite manifestar-se fisicamente -, que houve o desenvolvimento das quatro novas consciências citadas.

4. A obsolescência do ensino

Com essas considerações, posso chegar à minha tese: o ensino está obsoleto porque não acompanhou o desenvolvimento da essência humana no século XX. As quatro consciências citadas mostram como o ser humano mudou, para melhor, em várias áreas. Infelizmente, o ensino em geral continuou fundamentalmente o mesmo.
É uma tragédia que se tenha a intuição de que algo está profundamente errado com o ensino, mas que em vez de se constatar que ele não acompanhou a evolução da entidade humana profunda acha-se que ele não acompanhou o desenvolvimento tecnológico.
Vou citar aqui algumas das características do ensino que não acompanharam essa evolução; chamá-las-ei de características retrógradas da educação.

4.1 Pressão prussiana

A primeira característica retrógrada conservada pela educação em geral foi o fato costumeiro de se forçar os alunos a estudar, e não fazer com que eles estudem devido ao interesse, à curiosidade, à sede de saber, à aplicabilidade do aprendido e ao entusiasmo que neles deveriam ser instilados. Os leitores que me desculpem, fiz um erro; eu deveria ter dito "que neles matamos", pois toda criança pequena é super-curiosa, quer aprender e saber tudo - apesar de ser um saber intuitivo, não-consciente e não-intelectual -, como por exemplo a capacidade de pular corda, agarrar uma bola no ar ou reconhecer animais e pessoas.

Esse forçar a estudar assume duas facetas principais: as notas e as reprovações. Fruto do citado desenvolvimento da consciência dos direitos humanos, todos abominamos hoje em dia as agressões físicas aos alunos. Essas agressões eram relativamente comuns até a metade do século XX - eu mesmo presenciei talvez na 3a série (em 1948) como um professor de língua estrangeira dava umas belas palmadas no rosto de coleguinhas indisciplinados, sem que ninguém protestasse contra isso (aliás, esse professor tinha um número de campo de concentração nazista tatuado no braço). No entanto, poucos, pouquíssimos percebem que as notas baixas e reprovações são punições muito piores do que as físicas, pois são morais. Uma dor física e a revolta daí decorrente podem passar, pois a causa é momentânea, mas a frustração de tirar uma nota baixa ou ter sido reprovado permanece por muito tempo, talvez em alguns casos até para sempre, pois fará parte do histórico escolar. Uma agressão física pode ser compensada com um ato de carinho feito depois, talvez até com um pedido de desculpas. Como compensar uma nota baixa ou uma reprovação que ficam registradas física e indelevelmente para sempre e, no caso da segunda, pode afetar o desenrolar de toda uma vida? Além disso, um tapa é dado por uma outra pessoa; quem tira uma nota baixa em geral levou um tapa moral em grande parte de si próprio.

As notas quantificam o inquantificável: conhecimento, maturidade, capacidade, criatividade. Os alunos sabem, pelo menos em seu inconsciente, que elas são ridículas. O que significa uma nota 5: o conhecimento de metade dos pontos caídos na prova ou da metade de cada ponto, ou mesmo de uma combinação qualquer de partes ponderadas dessas duas situações? Quantas notas baixas são devidas a um desânimo, a uma frustração com a falta de interesse em uma matéria mal apresentada, a um estado mental ou emocional anormal durante uma prova, etc.? O aluno deveria ser penalizado por tudo isso? [Setzer e Setzer].

Além disso, as notas são impessoais, reduzindo os alunos a coisas enumeráveis. Ela massificam, tratando todos da mesma maneira. Se são resultados de testes de múltipla escolha, através destes reduzem o conhecimento a uma pálida sombra do que ele deveria ser. Se as questões são discursivas, a nota é pseudo-objetiva e reflete também a subjetividade momentânea do professor. Aliás, este deveria tentar, ao corrigir questões ou um trabalho, ser o mais objetivo possível, isto é, não se trata mais de dois seres humanos individuais interagindo entre si: ambos foram reduzidos a máquinas.
Quanto a reprovações, não poderia haver coisa pior no âmbito da educação do que um aluno repetir de ano. Ele fica frustrado, não conseguindo render no ano seguinte aquilo que poderia. Fica deslocado em relação aos colegas de classe, que ainda não têm sua maturidade física e psicológica, e talvez os prejudique. Dessa maneira, cria-se um bloqueio para o aprendizado.

É interessante notar que, em termos de notas e reprovações, forçam-se todos os alunos de uma classe a saber as mesmas coisas da mesma maneira, prejudicando-se assim o desenvolvimento da individualidade. Um aluno que não tem inclinação para história pode ser excelente em ciências ou artes. Em lugar de "todo aluno tem direito à educação" passou-se a "todo aluno tem o dever de ter a mesma educação". Por exemplo, o "provão", exame estatal único, exige o mesmo conhecimento de todos. É conhecido o fato de que um jovem pode durante muito tempo não ter interesse em alguma matéria, e ser aparentemente um mau aluno nela. De repente, ele desperta para a mesma, passando a ser excelente aluno. Em muitos casos a situação antes disso levaria a reprovações que talvez impeçam para sempre aquele despertar.

Aplaudo a iniciativa governamental de eliminar as reprovações nos primeiros anos escolares. O que significa reprovar uma criança de 8 anos? Significa penalizá-la pela sua falta de tenacidade, de concentração, de objetividade. Mas essas são características de adultos, não de crianças. No entanto, essa eliminação deveria ser acompanhada por mudanças gerais na mentalidade de toda a escola, e principalmente dos professores, o que parece não ter ocorrido. Eles teriam que aprender a despertar o interesse e o entusiasmo dos alunos, deveriam tornar-se bons mestres. No fundo, notas e reprovações são ferramentas usadas pelos maus professores para forçar seus alunos a comportar-se em aula e estudar. A pressão prussiana deve acabar, mas ao mesmo tempo ser substituída por um ensino que leve os alunos a interessar-se pelo estudo - quando ele for necessário; por que fazer uma criança de 9 anos estudar em casa? Voltarei ao assunto das provas no item 4.3.
Pode-se, portanto, caracterizar o sistema de provas, notas e reprovações como um sistema desumano punitivo que força crianças e jovens a se comportarem como adultos, perdendo sua necessária infância e juventude. O resultado é uma tensão constante, o medo de ser reprovado. Conte-se pelo menos 11 anos de ensino fundamental e médio com essas tensões e pressões, e compreender-se-á em boa parte por que os alunos detestam tanto suas escolas, e por que chegam em geral tão desanimados à universidade, quando não esgotados pelo preparo para o exame vestibular. É também possível que muitos distúrbios psicológicos dos jovens sejam devidos a essas tensões.

Existe uma outra faceta do "ensino prussiano", que é o de simplesmente produzir o que Theodore Adorno chamou de "educação pela dureza", para com isso obterem-se futuros adultos com mais "fibra" e coragem para enfrentar as vicissitudes da vida. A esse respeito, Adorno escreveu no artigo "A educação após Auschwitz": "A imagem da educação pela dureza, na qual muitos crêem irrefletidamente, é basicamente errada. A concepção de que virilidade signifique o máximo de capacidade para suportar já se transformou há tempos em símbolo do masoquismo que - como demonstra a psicologia - se funde com demasiada facilidade ao sadismo. Em última análise, a elogiada têmpera para a qual se é educado significa pura e simplesmente indiferença à dor. E não se faz tanta distinção assim entre uma e outra. Aquele que é duro contra si mesmo adquire o direito de sê-lo contra os demais e se vinga da dor que não teve a liberdade de demonstrar, que precisou reprimir." [Adorno 1986 pg. 39]. Essas palavras fazem-me lembrar dos tristes episódios de trote. Hoje em dia, os colegas ainda podem demonstrar dureza física, mas o desaparecimento gradativo do trote físico e humilhante mostra que os jovens estão se conscientizando das novas características humanas que descrevi. Mas os professores não podem mais usar aqueles recursos. Por isso, eles apelam para as punições escolares legais (advertência, suspensão, etc.), mas principalmente para as notas e reprovações.

4.2 Ensino abstrato

Um outro ponto em que a escola está obsoleta é no fato de o ensino ser excessivamente abstrato. Como se ensina o que é uma ilha? "Um pedaço de terra cercado de água por todos os lados." Esse é um exemplo típico de como a escola está alheia à natureza de uma criança. Essa definição abstrata não corresponde em absoluto às características da idade em que ela é dada (ao redor dos 8 anos). Nessa fase a criança ainda está ligada demais ao seu ambiente, à realidade das coisas, e uma abstração dessas não tem para ela muito significado. Ela procura algo interessante, algo curioso, algo vivo e artístico, com contrastes estéticos, algo prático para sua vida. O que recebe? Uma definição morta, sem vida, sem arte, ainda por cima errada (não há água nos lados de cima e de baixo). Ainda bem que não se dá a definição de uma árvore ("um pedaço de pau fincado a 90 graus no solo, com ramificações, blá blá"), o que não impede as crianças de criarem um conceito correto de árvore por vivência própria. Também no caso da ilha dever-se-ia criar vivências, se não for por visita a ilhas de verdade, talvez usando bacias com água e areia, contando-se aventuras de náufragos, etc.

Todo ensino fundamental e médio deveria ser calcado na realidade, adquirindo mais conceituação abstrata somente no segundo. No ensino fundamental, deve-se ensinar a observar e descrever os fenômenos, para explicá-los no ensino médio, como por exemplo o fato de uma bola lançada fazer uma curva no ar. Também não faz sentido ensinar provas de teoremas antes dessa idade. Fui obrigado a provar teoremas - pelo menos eram de geometria - no 1o ano do antigo ginásio, atual 5a série; eu olhava para o livro, via dois triângulos semelhantes ilustrando as hipóteses e dizia: "mas eu vejo que eles são semelhantes, para que provar isso?"

Um exemplo terrível do excesso de abstração no ensino foi a Matemática Moderna, em que as crianças aprendiam a fazer intersecções de conjuntos de bananas e laranjas (o que será que isso dá?) mas não sabiam fazer as contas da feira. Para uma crítica contundente à Matemática Moderna, veja-se o excelente livro de Morris Kline, onde ele mostra que ela foi uma conseqüência da transposição, para o ensino, das tendências da pesquisa em Matemática no século XX (antes disso, a Matemática era sempre motivada por aplicações) [Kline 1976, cap. 10, especialmente a pg. 157]. Isso demonstra uma total falta de sensibilidade para com as crianças e para com o ensino. Mas acho que veio também ao encontro da mentalidade do "quanto mais abstrato, melhor" ou "o quanto mais divorciado da realidade, melhor".

Felizmente parece que está havendo cada vez mais interesse em se desenvolver métodos educacionais que partem de exemplos da realidade. Mas ainda encontramos exercícios como "A idade do vovô mais a da vovó dá 115 anos, e a diferença entre elas é de 5 anos, qual a idade deles?" Alguém por acaso já viu contar-se a alguém a idade de duas pessoas dessa maneira? Ou "Seja uma partícula ideal em movimento retilíneo uniformemente acelerado..." Alguém já viu uma partícula ideal? E ainda por cima em movimento r.u.a.? Morris Kline traz 6 outros exemplos de típicos problemas idiotas de Matemática [Kline 1976 pg. 100].

O ensino excessivamente abstrato trata os alunos como cérebros ambulantes, e não como seres humanos integrais. De fato, ele não leva em conta que não somos apenas intelecto, pensar abstrato, mas exercemos também outros tipos de pensamento. Por exemplo, a memória em imagens de coisas observadas, o pensamento imaginativo, poético - que associa imagens, metáforas, a fatos ou idéias, como "as nuvens estão singrando o céu azul", o pensamento artístico, que leva a intuições artísticas, o pensamento social, que leva a tomar iniciativas sociais intuitivas (nesses dois últimos casos, refiro-me a pensamentos que não se desenrolam racionalmente, em um trem de associações de conceitos), etc. Em particular, a ciência tem se baseado em modelos matemáticos, devido à objetividade da Matemática. Mas os modelos usados em Física e Química têm sido todos quantitativos, e agora, com o DNA, a quantificação penetrou de vez na biologia. Com isso, eliminam-se os aspectos qualitativos da natureza, fazendo com que o ser humano não possa relacionar-se com os resultados científicos. Isso aconteceria, por exemplo, com uma descrição da Mona Lisa em termos de pixels e seus comprimentos de onda... Mas muito pior é que com o paradigma da quantificação a ciência deixa de pesquisar uma enorme gama de fenômenos. Lembro-me de uma citação de Lord Kelvin, em que ele dizia que o que não podia ser matematizado não era objeto da ciência.

A esse respeito, vale a pena citar esforços recentes no sentido de se dar importância a outros tipos de pensamento e sensibilidade, como os de Daniel Goleman e Howard Gardner. No caso de Goleman, é dada importância à sensibilidade social, às emoções e a ações sociais [Goleman 1995]. Já Gardner chama a atenção para o fato de que a educação escolar tem tradicionalmente procurado desenvolver o que ele denomina de inteligências "Lógico-matemática" e "Lingüística", não desenvolvendo outras 5: "Musical", "Corporal-cinestésica", "Espacial", "Interpessoal" e "Intrapessoal" [Gardner 1995 pg. 22]. Ele propôs mudanças no ensino para se incentivar o desenvolvimento harmônico das 7 [idem pg. 107].

Nem mesmo a "Inteligência Lingüística" está sendo desenvolvida como antes. A TV brutalizou a linguagem. A esse respeito, recomendo o estudo do extraordinário livro de Neil Postman sobre a influência dos meios de comunicação na linguagem [Postman 1986]. Rainer Patzlaff vai mais longe: mostra que hoje fala-se muito menos, especialmente as crianças, e como isso pode afetar todo o desenvolvimento do indivíduo [Patzlaff 2000 pg. 104].

4.3 O armazenador de informações


Em geral, as escolas encaram o aprendizado como aquisição de informações, e não como formação global do jovem - educação em lato senso. Afinal, praticamente a única coisa que se cobra em provas é a memorização de informações. Mas isso não é uma exclusividade das escolas. Um ex-aluno meu fez em fevereiro de 1998 um curso do software integrado de gestão administrativa e de produção (ERP, "Enterprise Resource Planning") mais vendido no mundo. Ele contou-me que o exame final exigiu muita memorização de detalhes, como por exemplo uma questão que perguntava em que parte da tela ficava um certo ícone. Nesse caso, por se tratar de curso para profissionais, as conseqüências não são tão trágicas quanto no caso de jovens que estão em formação; no entanto o caso é ridículo pois detalhes de uso de um software sempre podem ser consultados nos manuais ou no "on-line help".

Essa obsessão pela memorização é bem caracterizada nas provas: exige-se que o aluno saiba fatos e técnicas, expressas verbalmente, no momento em que elas são realizadas. No entanto, tudo isso será praticamente esquecido. Gostaria de fazer uma pergunta ao leitor: quanto lembra do que estudou para as centenas de provas que fez em sua vida? Por exemplo, se alguma vez passou em um vestibular para um curso muito concorrido, passaria hoje nesse mesmo exame? Certamente todos lembramos quase nada do que tivemos que aprender para fazer provas durante nossa vida escolar e universitária. Mas, nesse caso, qual foi a utilidade de termos estudado intensamente para essas provas? O mais importante que deve restar de um ensino é um conhecimento geral sobre a matéria vista e um amadurecimento em relação a ela e às capacidades intelectuais, afetivas, e volitivas, bem como sociais, artísticas e artesanais. Provas não ajudam nesse sentido, pelo contrário, prejudicam, pois em lugar de se verificar constantemente se cada aluno está tendo aqueles amadurecimentos, espera-se a prova para se constatar uma parte insignificante dos mesmos. Os alunos também acostumam-se a só estudar para as provas. Será que não seria muito mais eficiente e humano entusiasmar o aluno pelo aprendizado e exigir um esforço dele sob forma de trabalhos? As próprias provas poderiam ser diferentes: em vez de exigir qualquer memorização, elas poderiam apresentar certos conceitos e solicitar a resolução de questões e problemas em torno desses conceitos, de tal modo que, se o aluno não tiver um conhecimento básico e o domínio da técnica essencial do assunto, ele não consegue resolvê-los. Mas mesmo se ele não conseguir resolvê-los é preciso um conhecimento profundo sobre cada aluno para decidir o que fazer para ele adquirir esses conhecimentos e as técnicas básicas, ou mesmo concluir e que ele amadureceu o suficiente e não precisa ter os conhecimentos e dominar as técnicas pedidas na prova, ou talvez até os tenha e foi mal nela por razões pessoais.

Acima de tudo, na avaliação seria necessário compreender o significado de um certo conhecimento para a maturação global do aluno. Para isso, é necessário ter-se um modelo do desenvolvimento global da criança e do jovem, e do que se almeja para um adulto. Conheço dois desses modelos: o de Piaget, que é muito parcial, pois preocupou-se apenas com os aspectos cognitivos formais e estruturais [Piaget 1977], e o de Rudolf Steiner, empregado desde 1919 nas mais de 800 escolas Waldorf pelo mundo todo (13 no Brasil, sendo 3 com curso colegial, a mais antiga datando de 1956; veja-se www.sab.org.br para diretórios - mantidos por mim - de escolas e jardins Waldorf na América Latina e no Brasil, respectivamente). O modelo de Steiner é muito mais abrangente do que o de Piaget, pois leva em conta todos os aspectos do desenvolvimento, seja físico, fisiológico, psicológico como psíquico, passando pelo temperamento e as capacidades que ele denominou de "anímicas" (e não há provas científicas de que sejam físicas): querer (volição), sentir e pensar (ver, por exemplo, [Lanz 1998 pg. 91]).
É baseado nesse último modelo que posso afirmar que falta às escolas noções claras daquele desenvolvimento, dos objetivos de uma educação ampla, isto é, o que deveria ser um adulto com uma educação adequada, e de como atingir esses objetivos. Devido a essas faltas, descambou-se para o ensino como aquisição de informações, e o aluno é tratado parcialmente como uma máquina de armazená-las, parcialmente como um animal a ser condicionado a reagir como treinado.
Resumindo, a escola peca por ser muito mais informativa do que formativa, muito mais condicionadora do que educativa.

4.4 Imediatismo


Ligado à falta de uma conceituação do que vem a ser um adulto equilibrado, com todas as potencialidades desenvolvidas - o que envolve capacidades científicas, artísticas, artesanais e sociais -, e como atingir esse objetivo, a escola preocupa-se geralmente somente com os alunos que têm à sua frente, na situação em que eles se encontram. O pensamento básico é o seguinte: por definição, os alunos devem aprender a matéria do currículo, que reflete o conhecimento desejável para o adulto, ponto final. Antigamente, havia uma certa intuição sobre a importância de certas matérias que não tinham aplicação imediata. Levava-se em conta que o que é aprendido sofre uma metamorfose no interior do aluno, aparecendo como capacidades em outras áreas. Existe uma história que se conta de um dos matemáticos estrangeiros mundialmente famosos que iniciaram o ensino e pesquisa de Matemática na USP, talvez Diedoné, Fantapié ou Albanese. Perguntado sobre o que se deveria ensinar no colegial aos alunos para que depois eles fossem bons estudantes universitários de Matemática, ele teria dito: "Por favor, não ensinem Matemática, ensinem latim!" Que sabedoria profunda, e que visão de longo prazo! O latim é uma língua natural com estrutura gramatical tal que seu estudo desenvolve a lógica, o formalismo e a capacidade dedutiva (ao se fazer traduções). Em minha época escolar, eram obrigatórios 4 anos de Latim (nas atuais 5a a 8a séries), sendo que alunos os que iam para o colegial "Clássico" (em contraposição ao "Científico") tinham ainda mais 3. A mesma falta de imediatismo levava à obrigatoriedade de 4 anos de Canto Orfeônico (onde aprendi teoria musical, depois é que me tornei músico) e de Trabalhos Manuais - além de 6 anos de Francês, 5 de Inglês e 1 de Espanhol, mais Filosofia, etc.). Não estou advogando a volta do latim, pois não é possível motivar os alunos com alguma utilidade dessa língua que lhes seja compreensível; estou apenas apontando para uma intuição que foi perdida e que não era imediatista.

Infelizmente a visão que o ser humano tem de si próprio empobreceu enormemente. Hoje impera o imediatismo: "Para que o latim? Não vai ser usado mesmo!" Não era assim que se pensava em termos educacionais em tempos de mais sabedoria. Só que essa sabedoria era instintiva, esperando por uma conceituação - na falta desta, descambou-se para a superficialidade, a trivialidade e o imediatismo.

É interessante notar que o ensino universitário era antigamente considerado não como diretamente profissionalizante, mas como uma formação básica. Ele provia a base de conhecimento e o desenvolvimento intelectual e humanístico para que o jovem formado pudesse aprender em seu futuro trabalho os detalhes necessários para sua profissão. Assim continua sendo, por exemplo, a menos da ausência atual de formação humanística, com o curso de Engenharia Civil - não se espera que o recém-formado seja capaz de projetar um prédio ou gerenciar o andamento de uma obra de vulto, pois para isso é necessário adquirir experiência trabalhando em um escritório de projetos ou de gerenciamento de obras. Ou o formando em Medicina, que já aprendeu toda a base teórica, devendo então passar por um Internato e uma Residência a fim de realmente adquirir prática. Hoje em dia deseja-se em muitas áreas que a universidade forme profissionais prontos para atuar no mercado de trabalho. É como se se ensinasse a apertar um certo tipo de parafuso, em lugar de conceituar o que são parafusos e como são produzidos, e estudar, examinar e usar muitos deles para se ilustrar os conceitos, permitindo que se aprenda no posto de trabalho as características de qualquer parafuso particular não estudado. O pior de nosso ensino especializado em parafusar somente certo tipo de parafusos, é que quando estes acabam, nossos bitolados formados passam a parafusar pregos. Esse é o caso de muitos cursos de computação.

4.5 Ensino maçante

Discutindo essas idéias com meus alunos em março de 1998, muitos surpreenderam-me dizendo que não haviam considerado a escola massacrante (V. 4.1), pelo menos no ensino fundamental e médio. Talvez isso se deve ao fato de eles serem extremamente inteligentes, especialmente em raciocínio lógico, pois passaram um dos vestibulares mais concorridos do Brasil; é portanto natural que aprendessem com facilidade. Já o seu curso atual, na universidade (Bacharelado em Ciência da Computação no IME-USP) consideravam de fato massacrante. Mas todos concordaram que a escola havia sido maçante. Isso talvez se deva a vários fatores. Entre eles, o fato de que os alunos são tratados como coisas e não como gente. Não há o cultivo de um relacionamento pessoal entre os professores e os alunos (não estou me referindo aqui a uma amizade). Com isso, a pessoa do professor lá na frente da classe é desinteressante; ele também se torna uma "coisa", alguém que deve ser aturado por obrigação. Um outro motivo é, como disse, o do ensino ser excessivamente abstrato, dirigido ao intelecto. Como os alunos são muito mais do que simples intelectos, pior, nem um intelecto desenvolvido eles ainda têm - isso se dará apenas no fim do colegial, talvez só na universidade -, não conseguem identificar-se com o conteúdo das aulas, e estas parecem cacetes. Em particular, imagine-se uma criança ou jovem tendo que ficar sentado horas a fio diariamente, com uma ânsia de correr e pular lá fora no pátio, com uma ânsia de conversar e interagir socialmente com os colegas (cujas experiências e idéias são infinitamente mais interessantes do que aquela matéria abstrata sendo ensinada por aquela pessoa que pouco está se importando com a personalidade dos que tem à sua frente). No máximo de ação, os alunos escrevem algo no caderno - em geral copiando o que o professor escreveu no quadro, sem ter necessidade de compreender do que se trata, pois vão estudar só na véspera da prova... Assim, são horas de passividade, sem nenhuma atividade criadora, sem nenhum entusiasmo e envolvimento pessoal - pode haver algo mais maçante e odioso? Na Pedagogia Waldorf, cada aula é organizada conscientemente pelo professor em um ritmo de inspiração (absorção) e de expiração (fazer algo) alternadas. Aulas de matérias intelectuais são alternadas com aulas de matérias artísticas e artesanais, produzindo-se assim um maior equilíbrio entre absorção e exteriorização. Observando-se a saída dos alunos no fim do período escolar em outras escolas, vê-se os estudantes como que explodirem de alívio: saem correndo, pulando, batendo-se. Já na saída das Escolas Waldorf os estudantes saem calmamente: não têm represada toda aquela ânsia de fazer algo, de colocar algo para fora, pois isso foi feito durante as aulas.

O ensino seria menos maçante se cada matéria procurasse relacionar o seu conteúdo com o aluno ou seu ambiente. Quando minha 2a filha estava na 6a série da Escola Waldorf Rudolf Steiner de São Paulo, fazia parte do currículo o estudo da antiga Roma. Na Pedagogia Waldorf, um professor deve idealmente tomar a classe na 1a série e levá-la até a 8a, dando todas as matérias principais; imagine-se o conhecimento que esse "professor de classe", como é denominado, desenvolve de cada criança e da classe como um todo. A objeção de que pode haver conflitos e seria muito mau a classe agüentá-lo por muito tempo ocorre muito raramente, pois tanto o professor quanto a classe crescem juntos e, além disso, os outros professores devem estar em permanente vigilância para detectar qualquer problema mais grave. Para um relato vívido da experiência de um professor de classe Waldorf, veja-se o fascinante livro de Torin Finser [Finser 1994]. Pois bem, o professor de classe dessa minha filha teve a idéia genial de pôr os alunos a planejar uma próxima excursão da classe em forma de discussão no Senado Romano - os alunos, vestidos com lençóis em forma de togas assumiam os vários papéis da estrutura daquele órgão. Imagine-se a vivência que uma tal aula de história propicia! Um caso que aconteceu nessa escola foi o de um aluninho de 3a série que encontrou um amiguinho de uma outra escola. Este último disse: "Hoje a professora nos contou como se faz pão!" O aluninho Waldorf respondeu: "Que coincidência, também estamos estudando isso, só que nós fizemos e assamos os pães!" Por sinal, naquela escola cada classe de 3a série constrói seu forno de barro para assar os seus pães; parte da farinha é moída pelos próprios alunos, a partir de trigo que eles mesmos plantaram em aulas de jardinagem; visite-se essa escola para comprovar que não estou inventando...

Há um indício muito claro de a escola não ser maçante, pelo contrário, ser muito rica e interessante: os alunos deveriam ficar contentes com o fim das férias, e não tristes como soe acontecer.

4.6 Ensino apassivador

Como já mencionado, em geral os alunos ficam horas sentados nas suas carteiras, ouvindo o professor, que não se dirige a eles como seres globais, mas cabeças ambulantes. De vez em quando tomam nota das coisas ditas ou escritas no quadro. Isso leva a uma atitude extremamente passiva e conformista. Não se cultiva o impulso de participar, de fazer observações próprias e ter suas idéias.

Em particular, há tempos tenho chamado a atenção para um grave problema de aulas de Matemática, principalmente superior: tudo o que os professores dizem ou escrevem é verdade, não há o que discutir ou duvidar. Praticamente nada é sujeito a interpretações diferentes. Com isso, os alunos tornam-se cada vez mais passivos e apáticos. Na USP, os estudantes do Instituto de Matemática e Estatística (IME) são considerados por muitos docentes de outras faculdades como os mais passivos da universidade. Daí eu ter sugerido aos colegas que de vez em quando dessem aulas erradas de modo que os alunos percebessem isso e saíssem de sua atitude passiva. Uma outra medida seria dar várias soluções para um mesmo problema, discutindo-as comparativamente.

4.7 Competitividade

Para tornar a escola um pouco menos maçante e apassivadora, certos professores promovem competições, por exemplo de notas. No entanto, não percebem que se alguém ganha uma competição, fá-lo às custas de outro que a perde. O primeiro pode ficar contente mas isso se dá porque outro ficou triste. Competições são, assim, anti-sociais. Elas não incentivam uma atitude social, pelo contrário, incentivam o egoísmo e o orgulho pessoal.

Nunca consegui compreender o que anda na mente de sacerdotes de colégios ligados a confissões religiosas cristãs que promovem competições: a alegria dos que vencem às custas do sofrimento dos que perdem é pelo menos uma atitude anti-crística (uso "crístico" justamente para diferenciar do que se costuma chamar de "cristão" e que foi responsável por várias barbáries anti-crísticas no decorrer da história - felizmente hoje reconhecidas pelos "cristãos", que infelizmente ainda usam competições...).

Incentivar a competitividade não é só incentivar o desenvolvimento do egoísmo e massacrar os menos capazes no assunto da competição: é também apelar para instintos animais dentro do ser humano, desenvolvendo-os. A natureza é uma luta, uma competição constante, cada ser tentando seu lugar ao Sol em geral à custa de outros; por exemplo, uma árvore que cresce mais e tampa a luz das outras, um animal que reserva seu domínio ou elimina o animal da mesma espécie mas com alguma incapacidade. Só o ser humano pode ter compaixão e ceder seu lugar por um ato de amor altruísta; é uma das razões para eu considerar que ele não é um ser meramente natural - ele transcende a natureza. Na verdade, parece-me que ele jamais foi um ser totalmente natural.

O argumento de que nossa sociedade é competitiva e portanto precisamos ensinar a competir nunca é acompanhado da pergunta "mas a partir de que idade?" Em minha concepção e na experiência com meus 4 filhos, não há nenhuma necessidade de aprender a competir muito cedo. A vida profissional vai ensinar isso de qualquer maneira. Pelo contrário, a ausência de competitividade pode dar espaço para o cultivo de compaixão, de consciência social de ajuda e de sacrifício altruísta.

4.8 Elitismo

No Brasil, o bom ensino é hoje em dia claramente elitista do ponto de vista sócio-econômico. As classes mais favorecidas economicamente mantêm boas escolas particulares e cursinhos, protegendo egoisticamente seus filhos em detrimento dos filhos de pessoas com menos capacidade econômica. (Entre parênteses, se há um âmbito onde o Darwinismo seguramente impera entre os seres humanos, é o setor econômico.) Digo "em detrimento" pois não há preocupação dessas classes em melhorar o ensino das outras classes. Canalizam-se, assim, verbas de impostos para outras aplicações de interesse das primeiras (por exemplo, em segurança, em incentivos fiscais, etc.).

O resultado desse elitismo é uma injustiça social, e a condenação das classes economicamente menos favorecidas a ficarem para sempre como tal, já que o acesso a uma boa educação é condição fundamental para elas saírem de sua situação de miséria econômica e cultural.

5. As razões da obsolescência do ensino

Acabei de expor certas características negativas típicas do ensino de hoje em dia. Vejamos agora por que os defeitos citados não correspondem à nossa constituição humana atual, como representada pelas características vistas no capítulo 2.

5.1 Pressão prussiana

A pressão prussiana está em desacordo com nossas características atuais, pois choca-se diretamente com as consciências dos direitos humanos e da paz mundial. De fato, essas duas últimas indicam, como apontei no capítulo 2, que as pessoas desenvolveram uma sensibilidade para o fato de todos termos um Eu Superior que é a nossa essência, de mesma natureza em todos nós mas de características individuais em cada um. Como mencionei em 3.5, esse Eu não tem raça, sexo, religião ou nacionalidade e o seu desenvolvimento é que levou ao anti-racismo, ao anti-sexismo, ao anti-fundamentalismo, etc. O amor altruísta, quando praticado a partir de um ato de liberdade (e não como um costume da comunidade), é uma manifestação desse Eu Superior. (Não estou de acordo com Darwin quando ele fala da seleção natural dos grupos, e que o amor altruísta desenvolve-se para a sobrevivência do grupo, muito menos que ele é conseqüência da ação dos genes "egoístas", como quer Richard Dawkins [Dawkins 1989].)

O ensino prussiano não leva em conta o fato de cada aluno ter dentro de si esse Eu humano que está se desabrochando, e portanto tem que ser respeitado e venerado. Esse ensino trata os alunos como animais, que não têm um Eu individual, e que devem ser treinados, amestrados e disciplinados de uma maneira hoje em dia até ultrapassada no treinamento de animais, isto é, na base da pressão e do castigo. Como vimos, na classe essa pressão não é mais a da varinha de marmelo (pelo menos até aí já chegou a consciência dos direitos humanos), mas das notas e reprovações. Em lugar de se entusiasmar e incentivar os alunos, força-se-os a estudar e a ter disciplina sob essas pressões. As mesmas características que se desenvolveram no século XX, a ponto de se considerar que cada pessoa deve ser respeitada, e o massacre das guerras não é correto, faz com que os alunos sintam-se massacrados e injustiçados - principalmente depois da puberdade, quando começam a desenvolver sua capacidade de julgamento.

5.2 Ensino abstrato

As novas características humanas que levaram ao movimento ecológico, evidenciando um agudo senso para com a realidade e a sutileza da natureza, mostram que não queremos mais ficar em idéias abstratas que nada têm a ver com a realidade que nos cerca ou com a nossa realidade interior.

Os alunos devem sentir, pelo menos inconscientemente, uma frustração muito grande pelo fato de aprenderem coisas, teorias, que no fundo não têm nada a ver com o mundo em que vivem. Um exemplo extremo que me ocorre é o da prova de uma identidade trigonométrica, ensinada e exigida em minha época de colegial, e que não tem nenhuma utilidade prática.

5.3 O armazenador de informações

Do mesmo modo como desenvolvemos o sentidos dos direitos humanos e o da paz mundial, a consciência ecológica e a do universalismo, desenvolvemos a consciência de que somos muito mais do que um repositório de informações. As já citadas "Inteligências Múltiplas" de Howard Gardner (V. 4.2) são um indício dessa consciência de que há outras habilidades essenciais no ser humano para que ele viva plenamente, além de seu conhecimento adquirido por meio de informações. Em particular, ele mostra que o ensino tradicional, centrado nas Inteligências Lógico-Matemática e Lingüística, não é adequado ao sucesso profissional, ponto essencial de Goleman [Goleman 1995].

Os alunos de nossas escolas devem sentir-se profundamente frustrados por serem tratados como simples armazenadores de informações, e não como seres humanos com criatividade, com emoções e com sensibilidade social e para com a natureza.
Há também um outro aspecto importante neste item: as informações que queremos que nossos alunos armazenem são praticamente só as de caráter "científico", refletindo uma mentalidade prevalente: o que não é "científico" não tem valor e não deve ser objeto de estudo e pesquisa. E assim, são excluídas as vivências artísticas e sociais, que complementam a visão científica do mundo e não podem ser abarcadas por esta última. Em particular, a visão "científica" de mundo é hoje em dia essencialmente quantitativa, pois a modelagem matemática, introduzida principalmente por Galileu, Newton e Descartes foi a que deu origem àquilo que hoje mais se preza como resultado do conhecimento científico: as máquinas. Para mim, existem aspectos qualitativos na natureza e no ser humano impossíveis de serem expressos quantitativamente, e muito mais importantes que os aspectos quantitativos. Essa visão científica ainda leva a um enfoque reducionista, resultado do método analítico de Descartes: para resolver um problema, quebra-se-o em partes estanques. Esse método funciona muito bem com as máquinas, onde, como observou Richard Lewontin, as partes são estanques, mas é totalmente inapropriado para uma compreensão realmente profunda dos seres vivos [Lewontin 2000 pg. 79]. Como já tinha observado Goethe, eles têm uma unidade (que ele chamou em 1787 de "hen kai pan", "o uno e o todo"), que o estudo das partes nunca atinge [Steiner 1984 pgs. 25 e 53].

4. Imediatismo

A consciência ecológica mostra que o ser humano deixou de ser apenas imediatista. Estamos preocupados com conseqüências a longo prazo, como o efeito estufa, o desaparecimento de espécies vegetais e animais, etc. O imediatismo na educação é nesse sentido um contra-senso. Ele revela uma superficialidade que, parece-me, é detectada inconscientemente pelos alunos. Um exemplo de imediatismo é ignorar-se que a aprendizagem passa por metamorforses, de modo que o que é aprendido numa época da vida aflora mais tarde como uma capacidade em outra área. Por exemplo, não é dando liberdade às crianças (que esperam ser guiadas e orientadas) que se criam adultos livres; como resultado dessa liberdade aplicada na hora errada, pode-se, por exemplo, produzir adultos inseguros.

5.5 Ensino maçante


Como mostrei, as consciências dos direitos humanos, da paz e do universalismo devem-se a uma visão global do ser humano. Não é à toa que só recentemente apareceu a expressão "holístico", talvez como reação ao excesso de reducionismo. Mostrei também que o ensino é maçante por não ser dirigido aos alunos como seres globais, mas somente intelectuais ou armazenadores de informações. Além disso, a consciência ecológica mostra uma sensibilidade para com a natureza, com o real, o que pode indicar que o ensino voltado para as abstrações ou o que é virtual frustra a expectativa dos alunos de se ligarem e conhecerem (e, a partir do ensino médio, compreenderem) cada vez mais a natureza. O choque é óbvio.

5.6 O ensino apassivador

Todas as novas consciências foram marcadas por intensos movimentos, que envolveram ações de milhões de pessoas. Pode-se falar dos movimentos pelos direitos Humanos, pela paz, até mesmo o do "impeachment" de Fernando Collor, etc. Essas ações indicam que a tendência não é mais de se ficar passivo, esperando o mundo melhorar. Não se crê mais que um eremita numa caverna poderá melhorar o mundo - para isso devemos ser ativos socialmente. A atitude passiva imposta em geral pelo nosso ensino choca-se frontalmente contra a atitude de ação que caracteriza o ser humano moderno.

5.7 Competitividade


As consciências dos Direitos Humanos, da Paz e do Universalismo mostram como não se dá mais valor a aparências e a capacidades particulares (como as físicas ou intelectuais). Promover competições no ensino é voltar a tempos remotos onde não havia a consciência individual e social existentes hoje em dia.

Nos dias de hoje o mais importante é educar para o desenvolvimento da sensibilidade social, da compaixão e da responsabilidade social (ver o artigo sobre computadores e arte em meu "site"). Não estamos precisando de mais cientistas; talvez mais artistas até seja muito bom. Mas o que estamos precisando urgentemente é formar jovens adultos com impulsos sociais positivos e com energia para tentar mudar a derrocada social que estamos presenciando. O mundo está se acelerando tragicamente para a "luta de todos contra todos", como citado no Apocalipse de João [Apo. 6:4]. Somente a educação para o social poderá reverter esse caminho. Como mostrei, a competitividade é egoísta e anti-social. A escola que a promove é em minha opinião absolutamente retrógrada, pois não reconhece o novo ser humano dos dias de hoje e não percebe o que precisamos para os futuros próximo e distante. Insisto, a prioridade não deve ser na aquisição de mais conhecimento e mais técnica, o que precisamos urgentemente é desenvolver amor altruísta (que, aliás, pressupõe liberdade e portanto conhecimento). Isso deve ser feito por meio da educação e da auto-educação, pois se ficarmos esperando uma evolução natural devida aos "genes egoístas" de Richard Dawkins [Dawkins 1989] continuaremos a destruir egoisticamente nosso ambiente e nós mesmos.

5.8 Elitismo

O elitismo das boas escolas particulares choca-se diretamente com a consciência dos direitos humanos. Tanto os alunos das escolas privilegiadas como os das menos favorecidas devem estar cientes da injustiça que se está cometendo ao privilegiar apenas alguns, apesar de termos todos os mesmos direitos de seres humanos. O grande problema aqui é a confusão entre Escola Pública (gerida pela comunidade) e Escola Estatal (gerida pelo Estado, e portanto fadada a sofrer influências políticas), bem como o outro lado, da absurda exploração comercial do ensino nas escolas e universidades particulares com fins lucrativos.

6. A escola ideal


Tentei mostrar como as escolas não acompanharam em geral a evolução da consciência humana no século XX, como evidenciado nos 4 aspectos abordados no capítulo 3. Gostaria aqui de dar algumas indicações gerais de como poderia ser uma escola atual e para o futuro próximo, de acordo com as novas características humanas desenvolvidas no século XX.

6.1 Como encarar os alunos e o ensino

Os professores, de qualquer nível, deveriam encarar os alunos como seres humanos em desenvolvimento, isto é, com a sua essência completa mas ainda não desabrochada. Usando a vaga idéia de Eu Superior colocado no item 3.5, pode-se caracterizar a fase da infância e da juventude como um preparo para que esse Eu possa cada vez manifestar-se mais, até atingir sua plena capacidade de manifestação: a individualidade, a auto-consciência, a liberdade, a responsabilidade social, a capacidade de pensar objetivamente, a capacidade de exercer um amor altruísta, etc. É interessante que no Brasil a maioridade jurídica, isto é, a plena responsabilidade pelos próprios atos, dá-se apenas aos 21 anos. Uma antiga tradição devida a uma profunda visão intuitiva e holística do ser humano estabeleceu essa idade como um marco decisivo na vida de cada pessoa. Ela representa bem o final da referida fase de desabrochar.

Assim, cada aluno deve ser respeitado como uma pessoa em potencial. O professor assumiria nesse contexto o papel de simples ajudante da individualidade que está desenvolvendo seus "membros inferiores" para que seu Eu possa atuar neste mundo. Essa ajuda é imprescindível. O imperador alemão Frederikc II (1194-1250) fez uma trágica mas interessante experiência. Querendo testar se o ser humano já nasce com as plenas potencialidades de um adulto, isolou 3 recém-nascidos, que não tiveram nenhum contato social, a menos de receber comida e talvez higiene pessoal. Nenhum deles aprendeu a andar, falar ou pensar - e todos morreram antes dos 14 anos. Isso mostra que o ser humano não é um ser simplesmente genético: ele necessita do convívio social para se desenvolver. Além de ser genético e social, ele é um ser individual, isto é, possuidor daquele Eu que não é herdado e não é moldado pelo meio ambiente. Mas esse Eu necessita de uma ajuda social decisiva no sentido de desenvolver os "membros inferiores" da entidade humana para poder manifestar-se plenamente na idade adulta. Aí estaria, portanto, a grande missão do ensino: prover tanto o desenvolvimento harmonioso da entidade humana de maneira global como dar o conhecimento para que o futuro adulto possa localizar-se no mundo, compreendê-lo e nele atuar positivamente, em liberdade. Esse desenvolvimento harmonioso e global significa dar um ensino não só intelectual (como exemplificado na definição precoce de ilha, no item 4.2) mas também artístico e social. Até aproximadamente 9 anos é também imprescindível criar-se um ambiente de religiosidade - todas as crianças são religiosas por natureza (lembro-me que aos 10 anos de idade ainda achava que o estalar à noite da escada de madeira de minha casa era devido a anjos que estavam subindo - que empobrecimento das pobres crianças de hoje em dia, moderninhas, intelectualizadas, que perderam a religiosidade e a fantasia e acham que "anjo" é bobagem...). Esse sentimento de religiosidade pode ser cultivado através de uma veneração pelas maravilhas da natureza, contando-se a biografia de grandes personagens que se sacrificaram pela humanidade, e por outras ações e atitudes que não irei descrever aqui, pois já devo ter chocado em demasia os leitores materialistas (que, em geral, começam a tremer nas bases quando ouvem ou lêem qualquer coisa que tenha a ver com religiosidade). Em particular, somente uma pessoa que experimentou um sentimento de religiosidade pode escolher conscientemente ser intelectualmente um ateu, ou melhor, um materialista.

O professor deveria constantemente perguntar-se: "Que posso fazer para ajudar cada aluno nesta classe de modo a guiá-lo no desabrochar de sua constituição interior, dos impulsos individuais que ele traz consigo e de sua capacidade de realizá-los? O que posso fazer para equilibrar eventuais unilateralidades do aluno, contribuindo para que ele possa desenvolver todas as possíveis habilidades e não se concentre precocemente naquilo em que é bom por natureza, em detrimento de uma formação global?" Nesse sentido, ensinar deveria ser encarado como um ato de sacrifício: o professor não deve ensinar o que sabe ou gosta, mas aquilo que cada aluno necessita em cada momento de sua vida. Se o professor não sabe algo, deve aprendê-lo para poder transmitir aos alunos. Um outro sacrifício é suplantar seus eventuais preconceitos, simpatia ou antipatia para com este ou aquele aluno, procurando em cada um o que este tem de positivo e o que realmente é.

Pode-se sintetizar o ensino ideal com um ato de amor altruísta. Obviamente, o professor deve fazer um exercício cotidiano para amar seus alunos. Um sentimento de amor altruísta pelos alunos leva automaticamente a uma atitude de respeito e de veneração para com eles. Isso irradiará para toda a classe, que intuitivamente sentirá que o professor está lá principalmente para ajudar cada aluno. Como conseqüência os alunos da classe tenderão a tratar o professor com respeito e veneração. Eu não poderia enfatizar suficientemente o quanto considero esses dois últimos sentimentos importantes na educação. Isso contrabalançaria um pouco o desrespeito e o cinismo que impera cada vez mais no mundo, e que infelizmente os estudantes em geral já trazem de casa. (Gostaria muito de saber em que curso de pedagogia ou de licenciatura os alunos, futuros professores, ouviram algo assim humano como coloquei neste parágrafo...)

Adorno escreveu: "A estrutura atual da sociedade - e provavelmente há milênios - não reside, como se tem ideologicamente atribuído desde Aristóteles, na atração entre os homens, mas sim na busca do interesse próprio de cada um contra os interesses de todos os demais." [Adorno 1986 pg. 43]. Esse egoísmo tem aumentado terrivelmente, pois desde Adam Smith faz parte da ética do capitalismo, que hoje em dia tornou-se absolutamente selvagem. Somente a educação a partir do amor altruísta poderá reverter essa situação, que está levando ao fim da humanidade.

6.2 A experiência de vida do professor

O ensino deveria ser encarado também como uma transmissão da experiência de vida do professor. Obviamente, ela não é perfeita, e não deve ser o único modelo. Se, a partir do ensino médio, quando os alunos passam a desenvolver seu julgamento e capacidade crítica, todos os professores de uma determinada classe procurassem transmitir suas posições pessoais frente aos problemas do mundo, os alunos não ficariam sujeitos à influência de um só deles. Por outro lado, o estudo de biografias pode contribuir para alargar os exemplos de vida. Imagine-se quão extraordinário poderia ser o estudo da biografia de uma Hellen Keller ou de um Ghandi, por exemplo.

Quero enfatizar o primeiro ponto, pois vem de minha experiência pessoal de quase 4 décadas de ensino universitário. Meus alunos sempre manifestaram um extraordinário interesse por minhas idéias a respeito de temas gerais fora da matéria do curso, nas quais eu sempre toco brevemente em qualquer aula, a ponto de uma vez um deles ter perguntado se não seria possível concentrarmo-nos apenas nesses temas e esquecermos a matéria técnica. Obviamente, esta última tem que ser transmitida, mas acho que se deveria dedicar cerca de 1/4 de cada aula a transmitir as opiniões pessoais sobre fatos correntes do mundo, sobre espetáculos e palestras assistidos, sobre livros lidos, etc.

No fim de cada aula, passo uma avaliação que foi desenvolvida aparentemente na Universidade de Harvard, o "One-minute Paper": cada aluno deve escrever brevemente sobre o que aprendeu de mais importante na aula e qual a maior dúvida que ficou. Verifiquei que nas matérias técnicas, a quase totalidade dos "one-minute papers" versava sobre problemas, que eu havia abordado na aula, fora do conteúdo técnico. Isso mostra como os alunos estão sedentos de ouvir temas relevantes para sua vida diária, e que matérias técnicas, por mais interessantes que sejam (no caso, principalmente Teoria e Construção de Compiladores e Bancos de Dados), não se comparam com suas dúvidas existenciais e filosóficas. Imagine-se a riqueza de pontos de vista que um estudante de colegial ou universitário iria encontrar se cada um de seus professores discutisse em cada aula algo de interesse geral!

Estou tocando aqui num ponto fundamental: para mim, a transmissão da experiência de vida é um dos pontos fundamentais da educação. No ensino fundamental (até a 8a série) o aluno deve admirar seus professores pela sua personalidade e segurança, e como pessoas que vão mostrando-lhe o que o mundo é. A partir do ensino médio, quando as capacidades de julgamento e de crítica começam a despontar (e não devem ser incentivadas antes, pois seria uma aceleração indevida da maturação), o que o aluno deve admirar no mestre é seu conhecimento, isto é, como pessoa que vai levá-lo a compreender o mundo. Sempre se achou que esse conhecimento deveria ser o da matéria sendo ensinada; estou aqui chamando a atenção para o fato de o conhecimento de vida ser tão ou mais importante. No ensino fundamental, o professor - que deveria agora ser um generalista - deve ser um exemplo de virtude. A partir do ensino médio, os alunos saberão distinguir entre suas fraquezas e qualidades, na medida em que ele - que deveria ser um especialista - puder apresentar suas boas idéias e conceitos sobre o mundo. Com isso, o aspecto moral do professor adquire uma importância enorme. Infelizmente, na contratação de docentes em geral as escolas e faculdades preocupam-se exclusivamente com o aspecto de conhecimento técnico ou, pior ainda, como é comum no Brasil, a simples habilitação formal.

Assim, o relacionamento entre o professor e seus alunos deverá ser o de um conhecedor da matéria a ser ensinada e um conhecedor da vida. Muitos professores tentam estabelecer um relacionamento especial com os seus alunos por meio de tentativas de se parecem jovens, falando e agindo como eles. Isso é um erro; o professor não deve regredir aos costumes e idéias infantis ou juvenis de seus alunos, mas tornar-se um ideal de como eles poderiam comportar-se quando forem adultos. É exigir demais dos professores? Quem sabe, mas ninguém poderá negar que se eles puderem ser exemplos para os estudantes, e exporem suas opiniões sobre tudo, o ensino adquirirá um aspecto educacional muito maior e melhor.

6.3 Ensino orientador

Hoje em dia há várias correntes que dão ênfase ao aprendizado, e não ao ensino, e descartam a figura tradicional de um professor, que passa a ser o que se denominou um "facilitador". Este deve no máximo guiar seus alunos em seu auto-aprendizado; algumas correntes ainda propõem que nem isso deveria ser feito: o professor deve colocar à disposição de seus alunos algum material e esperar que venham perguntas.

O ideal dessas correntes é dar maior liberdade ao aluno, e acabar com as aulas tradicionais. Estou de acordo, como disse em 4.6, que as aulas tradicionais são muito apassivadoras e estão erradas. O outro extremo, que chamarei de ensino libertário representa outro erro trágico. Os estudantes devem ser permanentemente guiados, e é isso que eles esperam dos seus professores. Nem no nível superior os alunos têm capacidade de decidir o que é melhor para eles - já que em geral não conhecem de antemão o conteúdo das matérias e a atuação profissional futura -, imagine-se então no nível fundamental ou médio! Tenho a impressão de que o ensino libertário é uma confissão de desconhecimento por parte dos professores: eles não sabem o que é melhor para seus alunos, e assim têm medo de orientá-los erradamente; deixam, então, que cada um tome seu rumo e seja responsável pelo fracasso do ensino. Nesse sentido, não considero correta a tradição americana de deixar o aluno do colegial escolher as matérias que quer cursar, principalmente se envolverem conhecimentos básicos como ciências, história, geografia, línguas estrangeiras, etc.

Um outro aspecto do ensino libertário é que ele é adequado à auto-aprendizagem de um adulto, mas uma aberração com crianças e jovens, pois exige-lhes decisões de adultos. É mais uma infeliz aceleração do desenvolvimento. Um exemplo recente desse ensino libertário é dar a estudantes de ensino fundamental e de começo de médio o acesso à rede Internet. Tradicionalmente, a educação foi sempre altamente contextual. Os pais escolhiam os livros adequados justamente a seus filhos, em seu grau de amadurecimento e conhecimento; os professores ensinavam algo a seus alunos de acordo com o que lhes haviam ensinado nos dias anteriores. Em um método de ensino integrado, como na Pedagogia Waldorf, a contextualização faz o professor levar ainda em conta o que seus colegas estão dando, além de um profundo conhecimento de cada aluno e até alguma noção de sua família [Lanz 1998 pg. 83]. A Internet representa um ensino totalmente descontextualizado: a criança ou jovem tem à sua disposição um mundo de informações boas e más, e deve escolher sozinha o que deve ser lido. Essa escolha exige conhecimento, capacidade crítica e auto-controle (para que não se "surfe" indiscriminada e indisciplinadamente), que são típicos de adultos, e não de crianças ou jovens. Novamente aqui temos uma aceleração do desenvolvimento, que parece-me ser muito prejudicial: força-se o jovem a comportar-se como adulto. Na pior das hipóteses, ele comportar-se-á como criança ou jovem e lerá tudo quanto é coisa não apropriada para seu contexto e maturidade, o que também será prejudicial a seu desenvolvimento. Recomendo aos pais que acham que usar a Internet é muito útil a seus filhos, para ficarem ao lado destes, orientando-os nas buscas e leituras.

6.4 Ensino adequado à idade

Parece-me uma máxima óbvia o fato de um assunto não dever ser apresentado aos alunos da mesma maneira quando estes têm idades - e portanto maturidade - diferentes. O contrário significa massificar o ensino.

Para se ensinar de modo adequado a cada idade, é necessário contar com um modelo desenvolvimentista, isto é, como crianças e jovens vão se desenvolvendo à medida que vão amadurecendo. Esse modelo deve ser abrangente, isto é, não levar em conta apenas um ou outro aspecto, como o fez Piaget, como já discorri em 4.3. Um exemplo seria a idade adequada para se ensinar o modelo heliocêntrico. A humanidade levou milhares de anos para adquirir uma capacidade de abstração suficiente para descartar a forte impressão sensorial de o Sol, a Lua e as estrelas moverem-se no céu visível, e imaginar que eles estão fixos e nós nos movemos diuturnamente com a rotação da Terra. Obviamente é necessário esperar que as crianças desenvolvam essa abstração antes de abordar o heliocentrismo. As crianças pequenas são muito abertas ao exterior; de fato, até os 9 anos de idade em geral não percebem que são isoladas dele, isto é, sentem-se uma unidade com seu ambiente. Tudo é animista e tem vida, de modo que não é incorreto um pai admoestar uma cadeira que "fez o Joãozinho tropeçar". Se as crianças não fossem tão abertas ao mundo exterior, não aprenderiam a andar e a falar, o que fazem por imitação - e nunca mais farão em sua vida um desenvolvimento tão intenso. Por outro lado, elas estão aprendendo a confiar em seus sentidos, que nos são incrivelmente fiéis. Imagine-se como seríamos todos esquizofrênicos se não confiássemos no que vimos, e se quando não enxergamos algo com nitidez não tivéssemos a certeza disso! Insisto, qualquer pessoa vê o Sol movendo-se no céu durante um dia claro. Para achar que ele está parado é necessário não uma observação sensorial, mas um julgamento, que exige maturidade e capacidade de abstração. Para um relato fascinante de como a história da astronomia acompanhou e influenciou a capacidade de abstração humana, veja-se o livro de Arthur Koestler [Koestler 1964]. Infelizmente, os meios de comunicação, sendo de massa, não respeitam a maturidade de cada jovem ouvinte ou telespectador, de modo que os pais que lamentavelmente deixam seus filhos verem TV criam um grande problema de desenvolvimento - uma aceleração da capacidade de julgamento e da aquisição do informações. Outro exemplo é o fato de que somente ao redor da puberdade os jovens deveriam interessar-se por questões sexuais. A TV deturpa totalmente esse desenvolvimento sadio, com conseqüências psicológicas desastrosas. Por outro lado, o computador acelera inadequadamente o desenvolvimento de um raciocínio lógico e abstrato.

6.5 Respeito à individualidade de cada aluno

Vou aproveitar a deixa do item anterior e observar, através da questão sexual, como a escola ideal deveria respeitar cada aluno individualmente.

Considera-se hoje muito adequado que a escola dê educação sexual aos alunos (por enquanto, apenas teórica, mas quem sabe, como Neil Postman chamou a atenção [Postman 1986], o Admirável Mundo Novo de Huxley está se cumprindo e aí teremos aulas de laboratório sexual...) - e quanto antes melhor. Nessa questão há dois aspectos a serem considerados: que a questão sexual é algo muito íntimo, principalmente nos jovens, e que a maturação sexual não é uniforme em todos os jovens de uma classe escolar.

Quando um jovem descobre em si próprio o seu interesse por sexo e suas transformações fisiológicas, tende a fechar-se, o que pode representar um perigo do ponto de vista psicológico. É preciso muito tato para abordar a questão sexual, e acho que isso não deva ser feito em público - muito menos em meios de comunicação! Quando se trata desse assunto durante o ensino fundamental em uma classe, pode-se chocar aqueles que ainda não despertaram para a questão. Esse choque pode provocar uma aceleração no desenvolvimento, que não seguiria o amadurecimento natural, ou um fechamento em si mesmo. Por outro lado, em uma classe não se pode acompanhar individualmente a reação do jovem às palavras sendo ditas - se for negativa, em uma conversa pessoal poder-se-ia corrigir o rumo.

Já no colegial, a questão sexual deve ser abordada de um ponto de vista estritamente biológico. No fim do colegial, talvez fosse interessante abordá-la do ponto de vista moral (associando-se o ato sexual com o amor pelo parceiro, e não como satisfação de necessidade fisiológica - principalmente em relação aos rapazes). Para mais considerações sobre a educação sexual no lar e nas escolas segundo essas linhas, veja-se o capítulo correspondente do livro sobre Pedagogia Waldorf de Rudolf Lanz [Lanz 1998 pg. 176].

Essas minhas idéias aplicam-se a jovens com desenvolvimento "normal". Infelizmente, é raro hoje em dia encontrar jovens cuja infância e juventude foram preservadas, pois quase todos sofreram na questão sexual influências perniciosas da TV - quando não através dos próprios pais. Talvez essa situação indique ainda mais a necessidade de tratar do assunto de maneira pessoal, para poder equilibrar um pouco o mal já feito. Se se observa que um jovem está com interesses precoces por sexo, deve-se adiantar a conversa pessoal, sempre procurando adequá-la à maturidade global da criança. É muito importante verificar se esses interesses são genuínos, ou fruto de mera imitação ou mesmo auto-afirmação perante os colegas.

Transpondo para outras áreas, o que quero dizer é que há uma necessidade de se tratar cada aluno como uma individualidade nascente, e não como uma parte impessoal de uma classe. Nesse sentido, sempre fiz questão de aprender o nome de meus alunos. Esse conhecimento por si só estabelece um contato pessoal com cada um, levando a um início de tratamento individualizado.

6.5 Ensino equilibrado


Critiquei em vários trechos o fato de o ensino ser demasiadamente abstrato, isto é, dirigido para o intelecto. Uma escola equilibrada trataria também do ensino artístico/artesanal e social, através de atividades nessas áreas. No entanto, há épocas adequadas para cada um.

No Jardim de Infância não deveria haver nenhum ensino formal, nem mesmo o tão difundido ensino de leitura. Assim, cai totalmente fora o ensino intelectual, restando essencialmente o social, através de atividades como ouvir histórias, cantar, etc. e brincadeiras em grupos. Pode haver algumas atividades artísticas, talvez com ênfase em trabalhos manuais muito simples.

Já no ensino fundamental, a ênfase deve ser no ensino através da arte, até mesmo em Matemática (a Geometria presta-se particularmente à introdução de conceitos dessa área, com estética). Obviamente, o ensino de artes em si deveria ser tão ou mais intenso que o ensino formal, abrangendo música, teatro, pintura (sem computador! - veja-se o artigo sobre computadores e arte em meu "site"), desenho, modelagem, tecelagem, além de inúmeras matérias de trabalhos manuais. Infelizmente perdeu-se a noção de que as artes moldam positivamente o ser humano em formação. Sheakespeare, em O Mercador de Veneza, diz: "O homem que não tem música dentro de si ... serve para a traição, o assassinato e a perfídia! ... Não confiem nele!" O ensino científico deve limitar-se à observação e descrição cada vez mais cuidadosa dos fenômenos da natureza, explicando apenas os que podem ser compreendidos de maneira intuitiva e não, por exemplo, através de modelagem matemática. Em 15/9/1920, Rudolf Steiner disse em uma palestra: "Mas vejam o que ocorreu ultimamente: infelizmente, foram nossos cientistas que fizeram a pedagogia. Pessoas acostumadas a um raciocínio científico fizeram a pedagogia ...; chegou-se a postular que a formação do professor fosse científica, quando ambos, na realidade - o professor e o cientista -, devem ser coisas totalmente diversas" [Steiner 1997 pg. 15]. Um exemplo trágico relativamente recente nessa linha foi a Matemática Moderna (V. 4.2). Cuidado especial deve ser tomado no ensino social. Já discorri bastante sobre o aspecto social negativo da competição (V. 4.7 e 5.7). Posso sugerir como ensino social a organização de ajuda dos alunos mais dotados em cada área aos menos dotados, atividades em conjunto como coro, orquestra, excursões com divisão do trabalho, e particularmente teatro, que desenvolve enorme sensibilidade social. Pequenas peças podem ser encenadas em todas as séries. Tradicionalmente, nas Escolas Waldorf as 8as séries apresentam uma peça teatral completa, que é o coroamento do ensino fundamental.

No ensino médio, a ênfase deve ser no ensino científico, mas sem descuidar do ensino artístico (sem computador!) e social. É nessa idade que se deve introduzir formalismos como prova de teoremas e modelagem matemática através da Física. O ensino artístico deve aos poucos dirigir-se para um expressionismo que possa revelar a individualidade quase desabrochada do jovem nessa fase da vida, e que deveria ocorrer idealmente ao redor dos 17-18 anos.

Se no início do ensino fundamental imagens míticas são absolutamente adequadas, como a dos contos de fada e a da criação bíblica, no ensino médio o estudante deve entrar em contato com as teorias que procuram explicar o mundo através de conceitos, como a teoria da evolução ou a das cores de Newton. No entanto deve-se sempre chamar a atenção para o fato de essas duas e outras serem meras teorias, e não verdades. Seria extremamente importante que se mostrassem as limitações dessas teorias, e sua unilateralidade. Os dois exemplos mencionados prestam-se particularmente para isso. No segundo caso, seria interessante criticar o fato de Newton ter feito sua teoria a partir de um caso extremamente particular, a sua abertura de 1/3 de polegada na janela para deixar passar um raio de Sol que dava origem às 7 cores do arco-íris, incluindo o verde ([Newton 1979 pg. 26 - Book I, Part I, Exper. 3] - aliás, encontra-se nesse trecho um dos erros de Newton, pois ele afirma que não havia diferença entre o resultado da refração usando um prisma de vidro ou de água [pg. 31]; não foi seu único erro: ele também afirmou que "A perfeição dos telescópios é impedida pelas diferentes refrangibilidades dos raios de luz" [pg. 83, Pop. VII, Theor. VI], o que impediu, durante 90 anos depois de ele ter apresentado o seu telescópio refletor, o desenvolvimento das lentes acromáticas [Bjerke pgs. 62 e 92]). Se ele tivesse usado uma abertura muito pequena, teria obtido apenas 3 cores, vermelho, verde e azul, precisamente as que são usadas em uma tela de vídeo colorido (de onde ele teria que afirmar que o raio de luz do Sol é composto dessas três cores apenas...). Se tivesse usado uma abertura maior, teria de um lado vermelho, laranja e amarelo e do outro azul claro, azul escuro e violeta; obviamente a confluência dos dois próximos à claridade, pela diminuição do furo, produz o verde. Isso pode ser bem notado observando-se através de um prisma uma faixa de papel branco delimitada por duas folhas pretas, movendo-se uma dessas últimas. Aproveite-se a ocasião e faça-se a observação de um feixe de escuro através do prisma, formando-se uma faixa preta de uma folha dessa cor, delimitada por duas folhas brancas, para ver o espectro complementar, o "espectro de Goethe". Se Newton tivesse sido um biólogo usando microscópio e não um astrônomo usando um telescópio, teria se interessado por esses feixes de escuro e não de luz, chegando a uma teoria das cores exatamente complementar à sua [Bjerke 1961 pg. 86, parcialmente traduzido em Kollert 1992 pg. 58]. Nesta, as 3 cores básicas seriam o amarelo, o carmim e o vermelho, como se pode ver nas impressoras em que, contrariamente ao feixe de luz no tubo escuro de vídeo, apresentam o fundo complementar de uma folha branca de papel. Esses fenômenos podem ser facilmente feitos em classe usando-se um retroprojetor e colocando-se o prisma depois do espelho. Isso pode servir de crítica à atividade típica científica de partir de casos particulares (no caso de Newton, um feixe de luz de determinada espessura passando por um prisma), indo para os gerais (em geral nunca atingidos), em lugar de partir do geral e ir para o particular como no método científico de Goethe que, aliás, não é reducionista já por procurar e basear-se em fenômenos primordiais, os "Urphenomäne", irredutíveis [Steiner 1984 pg. 159].

No ensino médio, o ensino social deveria envolver trabalhos fora da escola, talvez em atividades sociais de ajuda em hospitais, creches, favelas, etc. Em particular, no Brasil parece-me ser de fundamental importância o contato com a miséria dos menos favorecidos econômica, social e culturalmente. Assim, em um ano poder-se-ia por exemplo programar a participação em movimentos ecológicos, em outro a ajuda a favelados, em outro a pessoas doentes ou idosas, etc. de acordo com a maturidade e o que se deseja educar.

7. Conclusões

Procurei mostrar como o ensino está obsoleto em relação ao desenvolvimento do ser humano no século XX, e como o ensino poderia ser mudado em linhas gerais a fim de adaptar-se ao novo ser humano que está se desenvolvendo. Em síntese, o ensino não se adaptou às mudanças ocorridas com o ser humano no século XX. Não importa se a hipótese é que essas mudanças são meramente culturais (a minha é de que são em parte constitucionais); o importante é reconhecer que houve mudanças drásticas na maneira de agir, de sentir e de pensar. Expus vários fatos que o comprovam e procurei mostrar que um ensino mais moderno e mais humano deveria em primeiro lugar adaptar-se a essas mudanças.

É preciso salientar que minhas idéias a respeito de um ensino mais moderno e humano, expostas no item 6, são inspiradas numa pedagogia que já existe desde 1919, a Pedagogia Waldorf, já mencionada em 4.3, 4.5, 6.3 e 6.5. Para uma boa introdução a ela, veja-se [Lanz 1998]. Em particular, o modelo de desenvolvimento do ser humano introduzido pelo fundador da Pedagogia Waldorf, Rudolf Steiner, e que serve de fundamento para essa pedagogia, estabelece uma base do que e como ensinar em cada idade (V. 6.4) levando em conta uma visão muito mais holística do que outros enfoques educacionais.

Examinando-se minhas considerações, ver-se-á que procurei tornar o ensino mais humano, considerando o aluno como um ser global em processo de se desabrochar e de se formar. O reflexivo desses dois últimos verbos é fundamental: o professor deve ajudar a criança e o jovem nesses processos numa atitude de orientação, baseada em uma atitude de amor altruísta e veneração pela individualidade que está cada vez se manifestando mais (V. 6.1).

Devido à minha preocupação centrar-se no aspecto humano profundo, ela não tratou do aspecto da técnica, das máquinas, na educação. De fato, contrariamente a uma boa parte da onda educacional do momento, sou contra o uso de máquinas na educação, a menos de casos e ocasiões especiais (vejam-se meus artigos "Os meios eletrônicos e a educação" e "TV e violência: um casamento perfeito", em meu "site").

Um desses casos é o ensino que deve levar a uma compreensão básica do funcionamento das máquinas mais comuns, feito durante o colegial (infelizmente, a introdução de circuitos integrados em muitas máquinas está tornando seu funcionamento incompreensível). Quantas pessoas sabem qual o princípio de funcionamento de um motor a explosão ou das asas de um avião? Um dos problemas graves relacionados com esse desconhecimento é que ele produz uma espécie de "paralisia mental": as pessoas perdem a curiosidade de saber qual o princípio de funcionamento das máquinas, por acharem que ele é difícil de ser compreendido, senão impossível. Essa perda acaba sendo extrapolada para outras áreas, tornando as pessoas menos humanas; infelizmente não cabe aqui alongar-me nesse ponto. Um outro problema é a decorrente incapacidade de criticar as propostas feitas pelos crentes em soluções tecnológicas para problemas de meio-ambiente, sociais e individuais (um bom exemplo atual é a pouca objeção à produção e consumo de alimentos transgênicos, apesar de não termos idéia de seu possível efeito pernicioso a longo prazo). Um outro ainda é a incapacidade de criticar o uso das máquinas, não se as colocando em seu devido lugar. Um exemplo crasso disso é o terrível impacto que o automóvel fez nas cidades e na sociedade. Por exemplo, hoje em dia todas as cidades do mundo são mais ou menos iguais, todas voltadas para o automóvel, que não tem cultura local, e não para os cidadãos que nelas moram. Um outro exemplo crasso é a TV, que entre outros efeitos negativos destruiu uma boa parte da vida familiar e da capacidade de imaginação, e portanto da criatividade das pessoas. Uma compreensão do automóvel e da TV e dos efeitos que eles produzem poderia levar pessoas a utilizarem-nos de maneira menos prejudicial, ou somente em ocasiões especiais.

Portanto, sou absolutamente a favor do uso de máquinas na educação para se mostrar o que elas são, e desenvolver um senso crítico do seu uso. Mas isso só faz sentido após a puberdade, durante o ensino médio, pois exige maturidade.
Quanto ao uso de máquinas para ensinar diversas matérias, eu admitiria apenas um uso muito restrito. Por exemplo, como já foi provado que a TV induz um estado de sonolência, semi-hipnótico, no telespectador [Krugman 1971, Walker 1980, Weinstein 1980], minha recomendação é que ela seja usada apenas como ilustração (por exemplo, em aulas de geografia ou biologia) com vídeo, por períodos muito breves (3-4 minutos). O professor deve exibir a ilustração, discuti-la, exibi-la e discuti-la novamente, evitando assim que as imagens sejam gravadas exclusivamente no subconsciente, como acontece normalmente com TV e filmes (pense-se nos milhões de imagens assistidas e quantas restam no consciente, levando-se em conta que o ser humano grava todas suas vivências), não tendo então efeito educativo mas condicionador. A propósito, é devido a esse efeito condicionador que os maiores gastos com propaganda das grandes empresas são feitos com a TV. Joelmir Betting, em sua coluna diária no jornal O Estado de São Paulo, traz os seguintes dados [11/4/01, pg. B2]: "Incluídos os custos indiretos de produção (cerca de 15%), o bolo publicitário alcançou R$12,9 bilhões em 2000. A caminho de R$14 bilhões em 2001. ... Em 2000, a televisão emplacou a fatia de 63,5%: 61% das redes abertas e 1,9% da TV paga. Os jornais ficaram com 19,9%, quase o dobro das revistas (10%). O rádio ... contentou-se com 4%. Anúncios de rua (outdoor), 2,5%." Em particular, o condicionamento da TV à violência já é um fato suficientemente comprovado a curto e a longo prazo [Liebert 1982 pg. 128, Centerwall 1992] (ver o artigo sobre TV e violência em meu "site").

No caso do computador, é importante reconhecer que ele, sendo uma máquina abstrata, lógico-simbólica, necessariamente impõe no usuário um raciocínio lógico-simbólico, algorítmico, mesmo usando-se um software com finalidades artísticas (ver artigo sobre computadores e arte em meu "site"). De fato, é impossível usar-se um software qualquer sem emitir comandos de uma linguagem textual ou icônica que é absolutamente formal, e que dispara funções matemáticas na máquina. Por exemplo, é exatamente isso que acontece quando se aciona o ícone de alinhar um parágrafo verticalmente à direita e à esquerda. Um outro problema é o fato de o computador descontextualizar a educação. Como vimos em 6.3, o caso da Internet é o exemplo mais crasso nesse sentido: uma criança usando essa rede tem a possibilidade de fazer o acesso àquilo que é adequado à sua idade e conhecimento, e também àquilo que não é. Penso que somente após os 17-18 anos deve-se dar ao jovem alguma liberdade de escolha quanto ao que deve ou gostaria de aprender, já que a falta de maturidade não pode lhe proporcionar uma visão do que é importante ser estudado.

Com essas e muitas outras considerações, cheguei à conclusão de que nunca um jovem deve usar um computador antes da puberdade, sendo que a idade ideal seria pelo menos ao redor dos 17 anos (ver artigo sobre computadores na educação em meu "site").

Uma das razões principais de se propor tanto o uso de computadores na educação (além de se submeter à intensa propaganda mercenária dos fabricantes e de se achar que eles são "moderninhos" por definição) é o fato de eles serem extremamente atraentes. De certo modo, isso deveria ser usado como advertência: uma máquina atrair mais do que um ser humano. Isso se deve, como expus, principalmente ao fato de os professores não considerarem as alterações havidas no ser humano no século XX, e ainda ensinarem de maneiras obsoletas em relação a essas alterações. Assim, suas aulas são maçantes, excessivamente abstratas, e o tipo de ensino é massacrante. O que está ocorrendo é que, em vez de se consertar o erro na fonte, isto, é, mudando-se a mentalidade dos professores e de toda a educação, introduz-se uma muleta que é o computador, pensando-se que assim se está modernizando a educação. No fundo isso é uma enganação, pois o computador atrai pelo "cosmético" ou pelo efeito de joguinho eletrônico, e não pelo conteúdo. Em minha opinião, o resultado será catastrófico. Por exemplo, o fato de o computador forçar um raciocínio lógico-simbólico significa que crianças ou jovens são forçados a pensar como adultos. Isso significa contribuir para com o esforço que se está fazendo no sentido de se acabar com a infância e a juventude. Neil Postman já chamou a atenção para esse fato em relação aos meios de comunicação [Postman 1999].

Meu esforço subjacente neste artigo foi de mostrar que a obsolescência do ensino não está na falta de tecnologia na sala de aula ou no lar. Pelo contrário, penso que o uso de tecnologia piorará muito a situação. O que falta é, no fundo, uma mudança na maneira de encarar o ser humano. Se alguém encara o ser humano como uma máquina, o que não é justificado cientificamente (pelo contrário, um exame despreconceituado do conhecimento científico de hoje mostra vários indícios de que não somos máquinas - veja-se o artigo "Desmistificação da onda do DNA", em meu "site"), então para essa pessoa o uso de máquinas no ensino certamente não apresenta grandes problemas. Se uma outra pessoa encara o ser humano não como uma máquina, mas como um animal (com algumas complexidades maiores do que os outros animais), então as nossas considerações também não farão muito sentido. Afinal, se a TV condiciona, e os animais não podem ser educados, mas sim condicionados, vamos continuar com os métodos tradicionais, talvez incrementados com o uso de tecnologias que ajudam a condicionar, armazenar informações, etc. Mas se alguém, como eu, considera que o ser humano não é um animal, isto é, contém componentes em sua constituição que não são físicos e que não se encontram nos animais, dando-lhe aquilo que os animais não têm, como liberdade, individualidade e auto-consciência, então achará que a educação tem que levar em conta o ser humano de uma maneira holística, isto é, como ser físico, anímico e espiritual. Foi inspirado em uma imagem dessas que teci todas as considerações e recomendações aqui propostas.