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Sociologia Geral
Prof. José Soares

Punir os Pobres: a nova gestão da miséria nos Estados Unidos

Nesta obra, WACQUANT discorre sobre as condições primitivas norte-americanas, suas casas de reclusão e os números alcançados pelas autoridades no encarceramento dos desviantes. Segue, ainda, o mesmo discurso da obra comentada acima, a exclusão e punição, que recai sobre a miséria, os pobres (11). Com isso, há uma migração da população do gueto para os presídios. Nada mais que um ostracismo social causado por uma xenofobia caracterizada pela cor da pele e descendência latina e africana (12).

A maior potência econômica e militar os Estados Unidos da América se apresenta, também, como o grande defensor da ordem. Estado representante e propagador do neoliberalismo, vem, ao longo dos anos, reduzindo sua atuação no âmbito assistencial e aumentando, proporcionalmente a tutela de controle, ou melhor, a atuação do aparelho estatal na gestão da miséria, punindo os pobres e controlando-os. Ao invés de gerir a diminuição da pobreza, fornecendo condições aos miseráveis de se colocarem à disposição do mercado de trabalho, é o contrário que ocorre; reduz ao máximo a assistência e maximiza a repressão dos institutos penais. Retirando os miseráveis do ambiente público.

Além do sistema penitenciário, o marcante em toda a política norte-americana é delegar aos próprios cidadãos o controle; há um autocontrole da sociedade.

O aparato penitenciário norte-americano orgulha aqueles defensores da reclusão nas instituições totais. A tendência é cominar ao máximo de delito a pena de privação da liberdade e de condenar o maior número de pessoas ao encarceramento celular. Com a intensidade repressiva do Estado, a população carcerária cresce vertiginosamente. É necessário destacar que, como no Brasil, os Estados Unidos da América sofre pela superlotação de suas acomodações carcerárias (considerando as devidas diferenças). As condições também são precárias. Para abarcar toda a população carcerária, surgem duas conseqüências: a maior destinação de verbas públicas para a estrutura penitenciária e a proliferação de casas de reclusão privadas (13).

A primeira conseqüência da crescente destinação de verbas ao sistema penitenciário é a redução, pelo governo dos Estados Unidos, do auxílio assistencial aos necessitados (14). O reflexo disto é o aumento da marginalização incrementando nos números da delinqüência (15).

Para auxiliar o encarceramento americano, surgem as casas de reclusão privadas, se constituindo, hodiernamente, dentre os negócios capitalistas mais rentáveis economicamente. E de modo a fornecer a estrutura de segurança, outro ramo que se torna lucrativo, é o de equipamentos de segurança, tanto os utilizados nos presídios como pelo uso pessoal dos indivíduos.
Além do volume econômico que circula no ambiente carcerário, outro aspecto deve ser ressaltado, qual seja, o grande número de empregos que surge nesta esfera repressora do Estado. Sejam empregos diretos e indiretos. Os diretos, tratando-se de administração penitenciária, dizem respeito aos funcionários (carcereiros, guardas, internos, funcionários da administração, etc.) e indiretos, tudo o que diz respeito àqueles ramos que auxiliam a estrutura carcerária (indústria armamentista, indústria de equipamentos de segurança, câmeras, alarmes, empreiteiras, etc.). Vislumbra-se, na indústria do cárcere, uma oportunidade de ganhos fáceis, pois os "delinqüentes são conhecidos e se sabe onde residem", basta observá-los e esperar que cometam um deslize.
Desta forma, tem-se o controle policialesco-repressivo em que o Estado usa de sua força e aparato para reprimir os desviados.
No entanto, há um outro meio mais insidioso e cruel praticado por cabeças norte-americanas nefastas que é o autocontrole social, que se constitui na divulgação, pelos órgãos de comunicação (públicos ou privados), de todos os dados referentes aos condenados ou, por vezes, apenas, acusados, pelo cometimento de um crime; inclui-se, na publicação, a zona da cidade onde reside (16). Para os criminosos sexuais há obrigações humilhantes, como a sua própria identificação para os vizinhos de criminoso sexual, o uso de adesivo no carro alertando os demais da sua condição de delinqüente (17). As atrocidades não param. WACQUANT ressalta que há páginas na rede mundial de computadores, privadas, que divulgam, mediante pagamento de uma taxa, fichas com todos os dados dos criminosos ali constantes. Dentre milhares de publicações na internet, estas estão entre as mais acessadas.
O importante a ser destacado, ainda, é que a manutenção destas páginas, quando feita, é com desdém, pois muitos dos "fichados" já cumpriram sua pena e continuam, por causa destes arquivos, sendo marginalizados e, como se não bastasse, há, ainda, informações equivocadas de pessoas que nunca cometeram um crime e estão ali fichadas.

Desta forma, o controle é exercido pela própria população, fato que causa, desde o primeiro momento, um mal-estar e um afastamento do delinqüente do convívio social. A procura pelos cidadãos por esse banco de dados é intensa, pois todos pretendem se precaver de seus vizinhos de rua ou até mesmo de bairro. Estas medidas vêm com a proposta de uma efetivação da segurança pelo panopticismo. Outrossim, é uma medida administrativa adotada pelo aparato burocrático estatal para o controle daqueles que estão em liberdade, como o comparecimento perante um juiz periodicamente.

Destarte, delega-se ao cidadão a tarefa de observação dos movimentos do desviante, ficando na espreita, à espera da primeira oportunidade de denunciá-lo, por algum ato que se considere impróprio a sua condição, ao Estado. Este, por sua vez, vê a oportunidade de tancafiá-lo em uma cela.

Haverá, ao invés de uma ressocialização, uma dessocialização de forma definitiva. Os laços sociais serão cortados sem mais a possibilidade de serem religados. Os estranhos serão afastados do espaço público, convívio social, e, esolados, formarão sua própria comunidade, anteriormente na periferia (ou melhor guetos) das cidades e/ou entre quatro paredes.

Os Estados Unidos da América (18) descura da sua assistencialidade para consignar a atenção ao mercado econômico. As importâncias atribuídas a essa área são díspares. A política americana visa proteger, em uma esfera de difícil acesso, o mercado econômico de distúrbios que possam causar-lhes os indesejados: e esconder seu fracasso na esfera social. Para isso, atua na exclusão definitiva dos miseráveis do mercado de trabalho, realocando-o em subempregos - empregos que ninguém mais se dispõe a laborar - e "limpando" os locais públicos para os cidadãos que participam do "sonho americano" (19) não serem perturbados pela miséria. Sendo assim, milhares de vidas são inutilizadas por apenas alguns "punhados de dólares".